Nós, da CONCP, queremos que nos nossos países martirizados durante séculos, humilhados, insultados, nunca possa reinar o insulto, e que nunca mais os nossos povos sejam explorados, não só pelos imperialistas, não só pelos europeus, não só pelas pessoas de pele branca, porque não confundimos a exploração ou os factores de exploração com a cor da pele dos homens; não queremos mais a exploração no nosso país, mesmo feita por negros. Lutamos para construir, nos nossos países, em Angola, em Moçambique, na Guiné, nas Ilhas de Cabo Verde, em S. Tomé, uma vida de felicidade, uma vida onde cada homem respeitará todos os homens, onde a disciplina não será imposta, onde não faltará o trabalho a ninguém, onde os salários serão justos, onde cada um terá o direito a tudo o que o homem construiu, criou para a felicidade dos homens. É para isso que lutamos. Se não o conseguirmos, teremos faltado aos nossos deveres, não atingiremos o objectivo da nossa luta”. AMILCAR CABRAL

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

EM CONVERSA COM O AUTOR DO DIÁRIO DE UM SOCIÓLOGO



Com base numa iniciativa de Kontrastes (João ferreira Dias-
http://o-kontrastes.blogspot.com/) decidi avançar e fazer uma espécie de blog-reportagens. A ideia é restringir estas entrevistas a blogers situados no mundo que fala português e, implicitamente, que o seu blog reflicta as aspirações, a história e a cultura dos respectivos povos. Blogs da ex-colónias ou que pugnem por elas, independentemente da geografia
Iniciamos esta rubrica com uma entrevista a Carlos Serra, sociólogo moçambicano e autor do Blog O Diário de Um Sociólogo
A profundidade e a lucidez da reflexão, como síntese criadora do trabalho do sociólogo aliada à inteligência e empenhamento social e politico do cidadão, convertem o Blog Diário de um Sociólogo não apenas numa espécie de sociologia de intervenção rápida, como diz o seu autor.O carácter pedagógico das suas intervenções converte este blog num lugar de eleição para os habitantes da blogosfera que, como o autor, habitam a complexidade indissociável da construção de uma sociedade dilacerada por velhos e novos sistemas e que continua a perseguir o modelo de desenvolvimento politico-económico, social e cultural adequado à realidade moçambicana
Navegador Solidário


1 . Como interpreta a disseminação e o interesse crescentes pelo fenómeno blogue?

Creio que o bloguismo permite três coisas ao mesmo tempo: (1) a auto-afirmação, (2) a des-paroquialização dos contactos e (3) a possibilidade de empatia ilimitada. Cria uma espécie de sensação, de vertigem mundializada,um espanto de cada momento.

2. Quando navega na blogosfera fá-lo à vista ou prefere rumar para um destino já conhecido?
Regra geral entretenho-me a procurar quer sites quer blogues que me façam pensar e regra geral a empresa é fadada a muitos fracassos. Uma parte significativa dos blogues tem a sua arquitectura construída em torno de auto-exegeses, com mais ou menos açúcar, do tipo “gosto de comer amendoins”.
Mesmo blogues que se pretendem sérios, são muita vezes apenas uma ampliação sofisticada desse tipo.

3. Quais as motivações que o conduziram à criação de um blog?
Descobri (tardiamente) que poderia transformar o blogue num veículo de crítica social instantânea, numa espécie de sociologia de intervenção rápida, em algo que poderia tentar partilhar com muitas pessoas de forma imediata, quase táctil. Por hipótese, as futuras revoluções sociais começarão nos blogues, não nas fábricas, nas praças ou nos campos.

4 . Qual a sua opinião sobre a blogosfera?
Creio que poderemos dividir os conteúdos da blogosfera em seis grandes campos (ainda que, claro, não esqueça os percursos transversais e as combinações): o blogue tipo “gosto de comer amendoins”, o blogue de distracção descerebralizadora, o blogue de exegese erótica, o blogue científico, o blogue político e o blogue comercial (directo ou disfarçado).

5. Os blogues poderão substituir a imprensa online?
Por hipótese isso talvez venha a tornar-se realidade dentro de 25/30 anos.
6. Em que medida os blogues intervêm na sua vida pessoal e profissional?
Dedico-lhes e especialmente ao meu- o tempo que dedicaria a uma actividade científica pré-net e pré-blogue. Herdei das máquinas de escrever a capacidade de me fascinar com estas “máquinas” espantosas e este tempo browniano.

7. O que é para si, um bom blog?
A resposta não pode ser unívoca e deve tomar em conta múltiplos aspectos.
Mas um bom blogue para mim é aquele que reúne duas condições: crítica social e seriedade cerebralizadora. Estamos num mundo onde a produção especializada de descerebralização, de despolitização, é cada vez mais possante. O Grande Capital é cada vez mais rigoroso nesse campo. Tenho sempre presente uma ideia-enzima de Pierre Bourdieu: quanto mais conscientes estivermos dos determinismos sociais mais livres podemos ser. E o blogue é um belo utensílio de luta. Foi primeiro um brinquedo para jovens de 13/16 anos, hoje pode ser uma arma política extremamente eficaz. No preciso momento em que o dotaram do húmus da recreação, nós podemos reinventá-lo e dar-lhe o selo de uma enxada cavando no território de uma futura humanidade mais solidária.

8. A sua participação no BOBs 2007 foi gratificante?
Absolutamente sim. Graças ao BOBs, a visibilidade do “diário de um sociólogo” é hoje maior. Pertenço a um pequeno país africano, a net permite suicidar essa realidade.

13 comentários:

Anónimo disse...

Grande nível no que toca as perguntas formuladas com respostas à altura.
Parabéns a ambos

Maria da Conceição Dias

AGRY disse...

Julgo poder agradecer em nome de Carlos Serra.
Obrigado
Agry

jpt disse...

É uma entrevista muito interessante. E seria também interessante ver os argumentos discutidos - não só por Serra ser o mais conhecido, activo e lido bloguista moçambicano (eu costumo dizer, passe a pobreza da analogia, que ali está o Abrupto do bloguismo moçambicano) mas pelo teor polémico (e utópico) das suas perspectivas.
Dado que V. gentilmente também me convidou para esta ronda de depoimentos não me parece elegante vir para aqui discutir as ideias alheias. Mas que há aqui pano para mangas ...

AGRY disse...

Aguardemos por esse debate, com serenidade e elevação, espero

jpt disse...

Mas por que é que não haveria de as ter? (é preciso afastar a ideia de que discussão de argumentos pode descambar) - O Serra aqui sai, e muito, do mainstream sobre blogs. Se não se discute isso de que vale ler? Eu continuo a acreditar que o melhor elogio não é o "que grande texto!" mas sim o seu debate.
cumprimentos

AGRY disse...

O meu comentário não lhe foi dirigido,tem um caráter genérico.
Talvez a expressão por mim utilizada não tenha sido feliz, mas não veja nela ,por favor, qualquer tipo de insinuação.
Talvez tenha sido influenciado por um comentário recente produzido no Diário de um Sociólogo em termos nada elegantes.É só

jpt disse...

não, não vi nada de pessoal. Até porque acima disse que não me parecia curial participar no debate (uma radical e até tonta contradição dado que o estou a desafiar). E concordo consigo, o debate deve ter limites (ainda que me desgoste o "respeitinho é muito bonito"). Apenas sublinhava que discussão não subentende obrigatoriamente o desvario
Cumprimentos, bom bloguismo

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

o jpt é muito dogmático.
Boa ideia a das blog-reportagens.
Abraço

AGRY disse...

Obrigado J.F. Saraiva.
Como deve calcular, o blog é um pouco a nossa casa. Temos de ter alguma dignidade a receber quem nos visita.
Aqui não há lugar para arruaceiros. Os outros, são benvindos e tenho muito gosto em os receber
Abraço
Agry
Porque não transporta, para aqui, um excerto da sua postagem?

Helena Antunes disse...

Parabéns pela iniciativa! No que respeita a esta entrevista acho-a muito interessante e foi bem conseguida. Parabéns a si e ao Carlos Serra!

E parabéns pelo blog, parece-me muito bom.

AGRY disse...

Obrigado pelos comentários. Os elogios, no que respeita à entrevista, serão o justo prémio do talento de Carlos Serra.

jpt disse...

desculpe-me o dono do blog por interrogar uma co-visita: "o jpt é muito dogmático" porquê?
- porque acha interessantes as ideias de Carlos Serra sobre o bloguismo? Porque as acha discutíveis? Porque as acha fora do mainstream? Porque acha que a discussão das ideias uma das grandes dimensões positivas no bloguismo? Porque acha que as discussões sobre argumentos não têm que descambar?
Como foram estes os argumentos que eu deixei nesta caixa de comentários a sua imputação deve prender-se a eles não - gostaria de perceber bem com qual deles se prende a sua opinião? Ou se a nenhum em particular e a todos em geral? Ou a nenhum mesmo e apenas "o jpt é muito dogmático" por outras coisas quaisquer e portanto não vale a pena o que aqui escreveu? Poder-me-á explicar?

Agry obrigado pela dignidade com que me recebe.

jpt disse...

Perdoar-me-á o dono da casa o regresso ao blog para uma conversa a que é alheio. Mas face à falta de resposta atrevo-me a constatar que a afirmação "o jpt é muito dogmático" é meramente dogmática. Desagradável também. Mas fundamentalmente não argumentada. É habitual neste meio das teclas. Hábito que não reduz a sua fealdade.

Cumprimentos à casa, continuação do bom bloguismo