NINGUÉM É DONO DO ESTADO
O Governo tinha arranjado uma forma bastante original de lidar com as reclamações fiscais: quem apresentasse dúvidas sobre a máquina fiscal via o sigilo bancário imediatamente violado pelos agentes do Estado.
O Tribunal Constitucional (TC) chumbou – e bem – esta originalidade da Lei Geral Tributária, que, entretanto, já dera polémica no Parlamento e suscitara dúvidas (pelos vistos legítimas) ao Presidente da República. Isto, em si mesmo, não tem uma gravidade por aí além. Cabe agora ao Governo reformular a norma, de modo a compatibilizá-la com a Constituição. No entanto, revela algo sobre o conceito que o Governo tem do Estado.
A possibilidade de reclamar de decisões administrativas ou outras não pode ser limitada por uma retaliação – foi isto que o TC veio dizer. Ao entender diferentemente, o Executivo mostra que não gosta de ser atrapalhado por pequenos direitos dos cidadãos. Ora isto é mau.
Um Governo que, nos inúmeros regulamentos que tem feito, utiliza quase sempre o argumento da consonância com a Constituição deveria compreender muito bem que a máquina do Estado não é sua propriedade, mas sim uma emanação da própria sociedade. Ou seja, os ‘donos’ do Estado somos todos nós, pelo que nos é devido o direito de reclamarmos, perguntarmos, pedirmos contas e – claro – elegermos aqueles que vão dirigir o Estado, ou seja, o Governo e o Presidente.
Não está em causa a possibilidade de ser levantado o sigilo bancário, ou de serem conhecidos os rendimentos de cada um – essa é outra discussão
O que o TC veio colocar em evidência é que o Estado tem de estar ao serviço dos cidadãos. E não ao seu próprio serviço, como, por vezes, o Governo parece entender.
Maia Ramos in Expresso 20/08/07
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