Nós, da CONCP, queremos que nos nossos países martirizados durante séculos, humilhados, insultados, nunca possa reinar o insulto, e que nunca mais os nossos povos sejam explorados, não só pelos imperialistas, não só pelos europeus, não só pelas pessoas de pele branca, porque não confundimos a exploração ou os factores de exploração com a cor da pele dos homens; não queremos mais a exploração no nosso país, mesmo feita por negros. Lutamos para construir, nos nossos países, em Angola, em Moçambique, na Guiné, nas Ilhas de Cabo Verde, em S. Tomé, uma vida de felicidade, uma vida onde cada homem respeitará todos os homens, onde a disciplina não será imposta, onde não faltará o trabalho a ninguém, onde os salários serão justos, onde cada um terá o direito a tudo o que o homem construiu, criou para a felicidade dos homens. É para isso que lutamos. Se não o conseguirmos, teremos faltado aos nossos deveres, não atingiremos o objectivo da nossa luta”. AMILCAR CABRAL

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

MAYRA ANDRADE: A NOVA DIVA CABO-VERDIANA



Há coincidências felizes não há? Imagine que o Navegador deparou com uma noticia na BBC que referencia que o primeiro registo musical de Mayra Andrade é. . . "Navega"!

"É verdade, a morna tem uma nova diva.
Como na letra do tema "Regasu", do álbum "Navega" - o primeiro registo musical da cabo-verdiana Mayra Andrade - a morna acompanhou a jovem desde muito cedo.
Mayra Andrade, a nova diva da música cabo-verdiana, está a causar furor perto e fora de casa, pelos círculos musicais da chamada 'música do mundo', e vem aqui Londres, em breve, apresentar 'Navega', na abertura de um concerto da conceituada Angélique Kidjo.
Mas esta jovem, que com apenas 22 anos já conta no seu palmarés com prémios e os elogios efusivos da crítica e do público, reúne na sua música um oceano de influências de todos os locais por onde passou, desde a infância, à adolescência até hoje, já adulta, a residir em Paris.
A BBC falou com Mayra Andrade a algumas semanas do seu concerto no conceituado palco do 'Barbican', no coração da capital britânica.
BBC: A Mayra vai ter de começar por me explicar o seu percurso. Como é que foi nascer a Cuba, passou por Cabo Verde, Angola, Senegal, Alemanha e agora foi parar a Paris? É uma verdadeira caixeira-viajante?

MAYRA: ..Sou...(risos)...Muita gente fica intrigada com esse meu nascimento em Cuba e perguntam-me se os meus pais são cubanos; mas foi propositado, digamos assim porque estava previsto um parto algo complicado para a minha mãe, e por falta de condições em 1985, o meu pai decidiu enviá-la para os hospitais cubanos, onde haveriam mais condições. Mas como eu sou uma menina simpática, nada do que estava previsto aconteceu e correu tudo muito bem. Isto explica o meu nascimento em Cuba.
Cabo Verde, porque sou cabo-verdiana, Senegal, Angola e Alemanha, alguns anos em cada um destes países porque o meu padrastro foi embaixador de Cabo-Verde e Paris porque foi onde eu decidi começar a minha vida profissional.

BBC: A Mayra começou a cantar cedo, e já deleitava audiências em Cabo Verde aos 15-16 anos; daí passou para os palcos em Portugal, França...Como é que se realizou esta transição dos palcos mais perto de casa para a exposição ao exterior que tem hoje?

MAYRA: Eu comecei com 15 anos a dar concertos em Cabo Verde - foi o ano em que regressei da Alemanha - e talvez por ser um meio pequeno todo o mundo começa a conhecer-te e a falar de ti, e rapidamente chegam mais convites de Cabo Verde. De lá foi organizada uma noite cabo-verdiana no Coliseu dos Recreios em Lisboa, tinha eu 16 anos, era mais jovem portanto - era um concerto sobre três gerações de música cabo-verdiana. Acho que foi a primeira vez que saí de Cabo Verde para cantar mais sériamente.

Depois foram os jogos da francofonia em 2001, onde eu ganhei a medalha de ouro para Cabo Verde e depois vim instalar-me em França e comecei a dar concertos e, apesar do que se possa dizer, o mundo da música é muito pequeno e é cantando e cantando que as pessoas vão conhecendo e, pronto, o resto já o deixo adivinhar...(sorriso)...

BBC: O mundo da música pode ser pequeno, mas a Mayra ocupa hoje já um lugar bem grande nesse meio. Na Alemanha acaba de lhe ser atribuído o prémio da crítica, os espectáculos têm-se multiplicado desde a França, a Portugal e agora até aqui a Inglaterra. Como é que a Mayra está a reagir a esta ascensão, se me permite, fulminante no panorama musical?

MAYRA: Fulminante?...(risos)...tudo é muito é muito relativo. Eu não tenho a sensação de ter uma ascensão fulminante. O que eu sinto é que há cerca de 6-7 anos que eu canto e que dou concertos e que é a progrssão normal das coisas quando tudo corre bem e que trabalhamos com as pessoas certas e que tentamos manter sempre uma linha, e somos fiéis ao que pensamos e ao que sentimos. Essa honestidade é muito ressentida pelo público.
Portanto, eu penso que é a evolução normal das coisas quando se trabalha com coração e fico muito contente com o que tem acontecido e espero que seja só um começo.
BBC: Agora uma pergunta ingrata mas incontornável. Sem querer fazer comparações, é-me quase impossível escapar ao que se ouve da boca de muitos: que Cabo Verde tem uma nova Cesária Évora. O que é a Mayra tem a dizer quando a comparam a Cesária Évora?

MAYRA: Eu sinceramente acho pouco delicado dizer que cabo Verde tem uma nova Cesária Évora, principalmente considerando que a Cesária Évora ainda está vivíssima, graças a Deus, em boa saúde e a dar concertos. como eu gosto de dizer, a Cesária não fez um testamento, não está à procura de sucessão nem eu estou à procura de suceder à Cesária ou seja a quem for. O meu objectivo é fazer o meu próprio caminho e a música que eu faço não é assim tão parecida com a música da Cesária, julgo eu.
É uma necessidade que as pessoas têm de comparar, por falta talvez de outras referências, mas acho que é preciso ter um bocadinho de paciência porque com o tempo isto vai ser ultrapassado. Até porque quando a Cesária começou era a única referência em relação a Cabo Verde, hoje em dia somos várias; várias cantoras, vários cantores, e acho que este país tão pequeno mas com tanta arte, tanta música, tantos talentos, tem o direito de ter mais do que uma ou duas representantes.
BBC: Nessa linha, para além dos sons africanos e cabo-verdianos, da coladera, do funaná, da morna, etc., sente-se na sua música um cheirinho a Brasil e a jazz...

MAYRA: Pois, os cheirinhos que se notam na minha música dependem muito da referência musical, da escola musical de quem a escuta...as coisas misturam-se e dão origem a algo novo e como tal é um pouco difícil identificar, exactamente, o que é que ibnfluenciou o quê.
Mas eu devo reconhecer que a música brasileira foi importante para mim, ouvi muita música brasileira, muito jazz, mas eu ouço tanta coisa - rock, reggae, pop - que fico mesmo com essa sensação de que as coisas se misturam e dão origem a algo novo. Não me interessa muito dissecar as influências para ter que identificá-las.

BBC: O Navega é o seu primeiro registo musical e nele inclui por exemplo um tema em francês. Pelo que sei não é a primeira vez que grava nesta língua...?

MAYRA: Não é a primeira vez. Eu participei no disco do Charles Aznavour em 2005, em que cantei um dueto com ele em francês, mas esta é uma língua que eu falo de forma fluente e corrente desde que sou criança, portanto já tive várias oportunidades de cantar em francês e gravar em francês noutras participações.

BBC: E qual é o impacto, qual é a reacção do público francês, por exemplo, à sua música?

MAYRA: É muito forte, até porque o compositor que fez esta música é uma pessoa cujo trabalho eu já conhecia, digamos, eu já era fã do TT, que fez a música, e ele tem esse dom de fazer músicas lindíssimas e com letras muito bem escritas e que ao mesmo tempo ficam assim na cabeça das pessoas.
Portanto é esse um pouco o impacto dessa música, que é uma das únicas que o público francês compreende, que pode cantar...é uma música que lhes fica na cabeça; dizem "fui dormir e acordei de manhã com essa mesma música". É giro, porque acontece assim um momento num concerto em que as pessoas aqui em França dizem, "ah! finalmente chegou a tal música!". Passa muito ná radio cá também, então...(risos)...

BBC: Neste álbum os sons são reconfortantes, uma verdadeira sopa de influências, mas a Mayra deixou ainda assim espaço nas letras não se evadindo por exemplo à passagem de algumas mensagens sociais. É o caso do tema "Dimokransa". O que é que a Mayra quiz dizer com a inclusão deste tema?

MAYRA: O homem, o grande homem, que escreveu essa música Kakà Barboza é que quiz dizer e disse muita coisa nessa música e eu interpretei-a à minha maneira para, digamos, dar a conhecer um período político-social particular em Cabo-Verde.

Foi uma música que ele escreveu no início dos anos 90, que eu acredito que seja necessário ser-se de Cabo-Verde ou conhecer o que aconteceu naquela altura para entender completamente esta letra, mas além disso é uma música muito forte e que toca não só os que participaram nesses tais acontecimentos que ele (Kakà Barboza) denuncia, mas toca também muito à juventude cabo-verdiana.

BBC: Como não podia deixar de ser, e como viajante que é, a Mayra fez também algumas alusões à diáspora neste álbum?

MAYRA: Sim, há um tema que fala da imigração, "Poc Li Dente é Tcheu" é uma música de Nhelas Spencer, que fala de um homem que se recusa a partir porque diz que o seu filho não pode crescer sem ele - que um filho não pode crescer num ninho sem pai.
Então ele diz que a vida em Cabo-Verde não está fácil, que lhe falta de tudo, mas que o passaporte dele será a sua coragem e força física para trabalhar e se poder manter naquela terra que ele não quer deixar.

BBC: Suponho eu e suponho que a Mayra o faça também, que em Cabo Verde sentem a sua presença de uma forma muito forte...qual é a mensagem que tem a dar aos seus fãs e a todos aqueles que ouvem a sua música em Cabo Verde e que a vêem como expoente do arquipélago?

MAYRA: (sorriso)...O que dizer?...Eu quero que todos saibam que eu me alimento do que eles me dão, digamos que eu vou beber exactamente à mesma fonte que eles.
Ir para Cabo Verde, sempre que eu vou cantar a Cabo Verde ou vou lá passar um tempo tranquilo e repousado, é isso que me alimenta e é o que me permite evoluir nessa estrada do mundo. Portanto, eu espero poder sempre contar com a força que me vem deste público que me tem seguido desde o início.

BBC: E projectos futuros...vai continuar a partir corações...(risos)...o que é que a Mayra tem em carteira para os tempos mais próximos?

MAYRA: Muitos concertos agendados até 2008, e no final de 2008 vou parar um pouco para começar a preparar o próximo disco, mas ainda muita água vai correr até lá. eu não falo muito dos projectos porque apesar de termos quen planear as coisas com alguma antecedência, eu vou vivendo as coisas da forma como elas me chegam e não sei o que será o amanhã...

Mayra Andrade em conversa com a Tribuna Cultural da BBC.

Mayra Andrade actua aqui em Londres, na sala de espectáculos Barbican, no dia 28 de Setembro, na primeira parte do concerto de Angelique Kidjó.

Luis Cardador em Londres

Sem comentários: