Nós, da CONCP, queremos que nos nossos países martirizados durante séculos, humilhados, insultados, nunca possa reinar o insulto, e que nunca mais os nossos povos sejam explorados, não só pelos imperialistas, não só pelos europeus, não só pelas pessoas de pele branca, porque não confundimos a exploração ou os factores de exploração com a cor da pele dos homens; não queremos mais a exploração no nosso país, mesmo feita por negros. Lutamos para construir, nos nossos países, em Angola, em Moçambique, na Guiné, nas Ilhas de Cabo Verde, em S. Tomé, uma vida de felicidade, uma vida onde cada homem respeitará todos os homens, onde a disciplina não será imposta, onde não faltará o trabalho a ninguém, onde os salários serão justos, onde cada um terá o direito a tudo o que o homem construiu, criou para a felicidade dos homens. É para isso que lutamos. Se não o conseguirmos, teremos faltado aos nossos deveres, não atingiremos o objectivo da nossa luta”. AMILCAR CABRAL

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

EM CONVERSA COM O AUTOR DO BLOG MASCHAMBA


Com base numa iniciativa de Kontrastes (João ferreira Dias- http://o-ontrastes.blogspot.com/) decidi avançar e fazer uma espécie de blog-reportagens. A ideia é restringir estas entrevistas a blogers situados no mundo que fala português e, implicitamente, que o seu blog reflicta as aspirações, a história e a cultura dos respectivos povos. Blogs da ex-colónias ou que pugnem por elas, independentemente da geografia
O autor do Blog Maschamba é um veterano no mundo bloguista e há muito que se afirmouno seu seio A sua presença nos elos de inúmeros blogs é a constatação do seu prestigio no seio duma comunidade que não pára de crescer. Conhecemo-nos neste habitat e , na altura, comunicámo-nos de uma forma efémera mas , apesar disso, foi decisiva para esta entrevista.O autor de Maschamba, José Pimentel Teixeira, é antropólogo de formação. A designação Maschamba, tem a ver com as suas vivências. Refiro-me a Moçambique
Agry White (Navegador solidário)

1 . Como interpreta a disseminação e o interesse crescentes pelo fenómeno blogue?
O primeiro factor, que muitas vezes se não refere quando se aborda isto, tem a ver com a "disseminação" da própria internet, um instrumento interactivo extraordinariamente poderoso. Penso que quem pertence a uma geração que comunicou em adulto ainda antes da sua emergência perceberá que este factor tecnológico foi uma revolução na palavra pública e no acesso à informação - o que, porventura, os que cresceram já com a "net" em casa e no emprego não sentirão de modo tão agudo. Neste âmbito uma análise desta questão tem que associar o bloguismo com o orkut e restantes comunidades, salas de chat e similares. São meios que não conheço, e que têm (terão) conteúdos sociológicos diferentes, mas separá-los à partida da comunicação bloguística parece-me artificial - é gente a comunicar de modo (quase)imediato muito para além do telefone e do rádio-amadorismo anteriores.
Noutro registo haverá um conjunto de factores que explicam a popularização da actividade, os quais não posso esgotar: o anseio da democratização da palavra (a universalização do "palanque do orador" londrino) - algo que está no mesmo eixo das mudanças na televisão portuguesa (falo da que conheço) desde meados de 90s, com a encenação da entrega do microfone ao povo (claques de futebol, concursos, entrevistas na rua, mesmo a mera plateia popular dos programas - não falam mas ESTÃO lá), e com a já velha ideia radiofónica de auscultar a "opinião pública" (a linha aberta para os ouvintes, o carro de exteriores); algum esgotamento ou, melhor dizendo, algum encerramento sobre si mesmos, dos orgãos de comunicação escritos - muito hierarquizados em termos geracionais, políticos ou culturais (depende do país e, até, da época); uma solidão urbana, que é visível muito em particular no mundo dos comentários, esse que é fundamental no mundo bloguístico, seja ao nível da polémica por vezes violenta (que abunda no bloguismo político) seja também no desenvolver de ambientes de extrema afectividade, por vezes estranhos aos visitantes ocasionais, que se encontram em blogs de nicho - exemplos particulares em blogs de expressão ficcional e, mais ainda, poética. Estou consciente que é uma afirmação preconceituosa esta de afirmar uma solidão prévia à expansão bloguística, talvez não se deva afirmar um deficit, talvez apenas (mas um "apenas" complexo) se trate de uma modificação dos hábitos de sociabilidade.
E, evidentemente, um generalizado culto da individualidade, de publicitação (quantas vezes exasperada) de uma autonomia desejada.

2. Quando navega na blogosfera fá-lo à vista ou prefere rumar para um destino já conhecido?
Cabotagem pura. Blogo há quatro anos, tenho um quadro de blogs cada vez mais reduzidos que leio, é absolutamente impossível acompanhar o movimento - não há tempo. E, com franqueza, é difícil encontrar blogs surpreendentes. Por vezes sigo indicações de bloguistas para um texto ou outro, mas o quadro está muito demarcado. Nem sempre foi assim, claro. Quase todos os dias leio consoante o tempo, 5 a 10 blogs entre cerca de 20 que prefiro.


3. Quais as motivações que o conduziram à criação de um blog?
Em termos gerais comecei a blogar em 2003 o ano da explosão bloguística em Portugal. Um pouco moda, arrastado por nomes como Francisco José Viegas e José Pacheco Pereira, que divulgaram o instrumento a seguir ao fenómeno O Meu Pipi. Em termos individuais: sou imigrante, há alguns anos que escrevia crónicas que enviava via e-mail a amigos e conhecidos, uma espécie de blog pré-blog entregue ao domicílio - foram alguns desses amigos que me incentivaram a encetar um blog, antes mesmo de ter ouvido falar em tal coisa.


4 . Qual a sua opinião sobre a blogosfera?
Não uso a palavra "blogosfera" que simula uma entidade, e já simulou uma comunidade. Ninguém diz "telefonoesfera" e todos andam agarrrados aos telemóveis (cada vez com mais funções intercomunicacionais). Nem mesmo "midiaesfera" se vai dizendo - e aqui há uma institucionalização e uma profissionalização que permitiria falar de um efectivo contexto socio-profissional (e até cultural). Há "bloguismo", uma actividade, com múlitplas versões, até profissionais hoje em dia. É uma actividade por enquanto maioritariamente lúdica que, fundamentalmente pelos constantes avanços tecnológicos, muito em breve dará campo para outras formas de comunicação amadora.
Não gosto da palavra "blogosfera" pois os seus utentes (da palavra) normalmente associam-na a uma postura ética, em particular no postular de um corpo de "deveres" do bloguista (morais, políticos, etc.) cujo mero postular contém um ridículo pró-censório cansativo, uma "deontologia" que me parece abusiva. E mais, os conteúdos normativos que aí surgem são normalmente egocentrados - os bloguistas assumem que a "blogosfera" deve ser algo mais ou menos como eles a exercem - e isso é muito visível no bloguismo político-opinativo (exactamente porque é um exercício bloguista que assenta no "dever ser", no "eu acho que"), surja ele com alter ego científico (social) ou meramente político - ainda que a distinção entre ambos os campos se dilua na vertigem bloguística de comentar o dia-a-dia: no fundo a mistura da facilidade teclística com a ideologia denuncionista promove esse egocentrismo "deontológico".


5. Os blogues poderão substituir a imprensa online?
É uma pergunta recorrente, esta da substituição da imprensa (neste caso online). Parte de um proconceito, o da sobrevalorização qualitativa e quantitativa dos bloguismo "informativo", "noticioso", "opinativo", entenda-se político, uma ideia de "político" que se confunde (por pobreza) com "actualidade". Ninguém pergunta se o bloguismo acabará com os museus ou os sites dos museus, com as editoras de livros, com os sites de música ou com o ascendente cinema na net, ou outra coisa qualquer. E essas perguntas têm tanta lógica como esta, apenas exigiriam outros tipo de leitor de blogs para a formular.
Já agora, nos blogs (a la imprensa) não há investigação, não há reportagem (pode ser que surjam numa ínfima minoria, mas só aí). Ecoam notícias, são trampolins de opiniões - e daí a sua interligação, interalimentadora, com a imprensa. Às vezes a retórica pode surgir como profundidade de informação (e há casos excelentes nesse sentido, blogs normalmente de recensões científicas ou literato-artísticas - mas raramente nas questões da "espuma dos dias") mas quanto muito haverá profundidade de reflexão sobre matérias alhures colectada - é normal, não há grande profissionalização.


6. Em que medida os blogues intervêm na sua vida pessoal e profissional?
Demasiado tempo gasto. Um instrumento contra as insónias. Alguns longínquos amigos em email muito de quando em vez.


7. O que é para si, um bom blog?
Cada um bloga como quer. Eu oscilo leituras entre dois tipos de bloguismo: o moçambicano e o português. Por razões sociológicas são bem diferentes: o moçambicano é muito respeitoso e doutoral, hierarquizado. Muito ético - predomina o deve ser assim ou assado. O conteúdo, a atitude, a postura são (auto)vigiados - no fundo um pouco a ideia "respeitadora" que está presente na introdução do seu questionário, " quem pugna pelas ex-colónias" (nestes caso Moçambique) - aliás é interessante ver a elevada percentagem de blogs que ao longo de anos têm "Moçambique" no nome. Um nacionalismo bloguístico (não critico, constato). Está-se no domínio do bloguismo de tese, que alías é sentido como quase obrigação (os exagerados elogios, o "desculpe-me intervir", ou "quem sou eu" etc, ainda se vão fazendo ouvir - mas menos, basta ver os inícios do Ideias para Debate para ver como o à vontade se está a expandir) Ou seja os blogs são aqui um elemento importante de democratização do acesso à palavra pública (e isso, como estrangeiro, encanta-me). Faltará ainda democratizar a palavra.
O bloguismo português é uma confusão. Uma muito maior multiplicidade de capitais culturais a funcionar (é sociológica e historicamente compreensível). Mas acima de tudo muito menos hierarquizado - seja em que registo (musica, politica, literatura, imprensa, etc.) for as figuras públicas e/ou graduadas bloguistas são dissecadas (justa e injustamente) pelas opiniões que botam. Prefiro assim, anda que haja exageros.
Um bom blog para mim: bem escrito, ágil, incoerente (não há paciência para as putativas coerências diárias, as agendas bloguísticas - quem tem agenda que vá trabalhar), um toque de ironia, um toque de paixão, um "eu" sem estrado por baixo. E com a arrogância de se saber que não é o maior do bairro. Um exemplo? O Nkhululeko infelizmente em estado comatoso (espero que o André leia isto e tenha vergonha de não continuar). No contexto em que surgiu é um verdadeiro projecto de desenvolvimento, de democratização da palavra inteligente. De descontrutor de hierarquias - e não me diga que estou a ser normativo, perguntou-me pelo meu gosto, é apenas esse que lhe dou.


8. A sua participação na blogosfera tem sido gratificante?
Claro - aprendi que escrevo pior do que pensava. E que ler é muito difícil, estamos sempre a incompreendermo-nos. Depois aprendi que há gente (que não conheço pessoalmente) que é de uma gentileza enorme, ternurenta até.
Gratificante não, mas enriquecedor sim: descobri que há um submundo na internet - e também no bloguismo [em particular nos comments do bloguismo político de extrema-esquerda] absolutamente pavoroso. Há gente horrível - os filmes americanos não são tão ficção assim, "serial killer is watching you". Felizmente (ainda) só quer teclar.

5 comentários:

Anónimo disse...

Cheguei aqui navegando ao acaso. Deixo para mais tarde comentários pertinentes: por agora, apenas um olá.

AGRY disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
AGRY disse...

Obrigado.Aguardo a sua visita
Abraço

jpt disse...

desculpar-me-á o paralelo, mas como vim aqui ontem e hoje para ver se tinha explicação de uma boutade que um seu visitante me tinha dirigido constatei das dificuldades em abrir a sua página: está muito cheia de informação, torna-a lenta.

AGRY disse...

Obrigado pelo alerta. Escreve quem sabe.Já tinha pensado nisso mas, como deve calcular, debato-me com problemas afectivos com o blog.Receio descaracterizá-lo.Bem, afectos à parte, sem dúvida que tenho de me encher de coragem e perder (ou ganhar) algum tempo para melhorar o performance do
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