Nós, da CONCP, queremos que nos nossos países martirizados durante séculos, humilhados, insultados, nunca possa reinar o insulto, e que nunca mais os nossos povos sejam explorados, não só pelos imperialistas, não só pelos europeus, não só pelas pessoas de pele branca, porque não confundimos a exploração ou os factores de exploração com a cor da pele dos homens; não queremos mais a exploração no nosso país, mesmo feita por negros. Lutamos para construir, nos nossos países, em Angola, em Moçambique, na Guiné, nas Ilhas de Cabo Verde, em S. Tomé, uma vida de felicidade, uma vida onde cada homem respeitará todos os homens, onde a disciplina não será imposta, onde não faltará o trabalho a ninguém, onde os salários serão justos, onde cada um terá o direito a tudo o que o homem construiu, criou para a felicidade dos homens. É para isso que lutamos. Se não o conseguirmos, teremos faltado aos nossos deveres, não atingiremos o objectivo da nossa luta”. AMILCAR CABRAL

quarta-feira, 19 de março de 2008

O DESAFIO E O FARDO DO TEMPO HISTÓRICO


A 24 de Janeiro de 2007, o The New York Times, a propósito da admiração do presi dente venezuelano Hugo Chávez por István Mészáros, apresentava este autor como «um estudioso marxista húngaro relativamente obscuro que argumenta haver uma alternativa ao capitalismo no seu livro de mil páginas, Para além do capital». A relativa obscuridade é uma definição curiosa, na medida em que se trata de um autor sobejamente conhecido, com uma vasta obra publicada e um dos mais destacados pensadores da não menos conhecida Escola de Budapeste. Após a sua graduação em filosofia, Mészáros foi assistente de Gyorgy Lukács, tendo abandonado a Hungria na sequência da invasão soviética de 1956. Passou, na qualidade de professor de filosofia, por diversas universidades em Itália, no Canadá e em Inglaterra e publicou incontáveis obras de filosofia, política, economia e cultura.
Publicada pela primeira vez em 1995, a sua obra fundamental é, efectivamente, Para além do Capital, um trabalho de grande fôlego escrito an longo de cerca de trinta anos, que condensa as suas teses essenciais e que representa uma ruptura com a tradição do pensamento marxista, procurando recuperar a radicalidade e a dimensão revolucionária da visão marxiana original. O seu título retlecte um triplo objectivo: desenvolver um projecto que vá para lá do sistema do capital, para lá de O Capital de Marx e para lá da perspectiva marxista consolidada nas condições históricas dos séculos XIX e XX.
Resumidamente e em traços gerais, há quatro teses fundamentais que definem o pensamento de Mészáros: 1) a distioção entre sistema do capital, enquanto forma de controlo socio-metabólico, fundada na exploração do trabalho e que estrutura toda a organização social, e capitalismo, enquanto ordem institucional histori camente determinada, associada à propriedade privada dos meios de produção; 2) a crítica do sistema de tipo soviético, enquanto componente particular do desenvolvimento do sistema do capital; 3) a consideração de que no actual período histórico estão a ser atingidos os limites absolutos do capital, ou seja, de que, no actual contexto de hegemonia global do capital, se vão rapidamente esgotando as possibilidades de perpetuação da sua lógica auto-expansiva; 4) a definição de uma alternativa ao sistema do capital, apontada para a sua plena erradicação e sustentada na construção de um sistema de controlo sociometabólico radicalmente novo, assente na gestão consciente, directa e não-hierarquizada da vida social por parte dos indivíduos.
Este enquadramento algo extenso permite compreender com mais clareza a lógica de O Desafio e o Fardo do Tempo Histórico, no contexto da obra de Mészáros. O objecto em análise neste livro é a categoria tempo histórico e a sua relação com o tempo de vida dos indivíduos. Partindo da crítica da tirania do tempo reificado do capital, totalmente sujeito às determinações objectivas da sua lógica de auto-expansão permanente, Mészáros enfatiza o carácter radicalmente ilimitado da história. A harmonização entre o tempo histórico e o tempo de vida dos indivíduos é absolutamente impossível no contexto da dominação do capital, na medida em que a sua própria existência depende exclusivamente da apropriação da totalidade do tempo de vida dos seres humanos, transformando-os, para utilizar as palavras de Marx, em meras «carcaças do tempo». As teorias que definem o sistema do capital como o fim da história constituem-se, assim, como justificação ideológica da subversão da consciência do tempo histórico e do seu carácter ilimitado. A imediaticidade intrínseca da compreensão do real nas actuais condições históricas, que tais teorias tomam evidente, é o espelho da naturalização da exploração do capital e da interiorização da ideia de que não há alternativa possível.
A proposta socialista para o século XXI, consubstanciada na superação do capital, terá, deste modo, que assentar na recuperação do controlo do tempo de vida por parte dos indivíduos, na base do estabelecimento de relações sociais automediadas, orientadas para a satisfação das necessidades humanas e não para a produção de valor. Dessa forma, a utilização livre do tempo será ela própria condição para a consciência plena do tempo histórico.Confira aqui

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